terça-feira, 29 de janeiro de 2013

A RUA DO BOSQUE



Havia muita história a respeito da rua proibida. A tal rua do Bosque. Aliás, de bosque não havia nada, era escura, sem flores, canteiros e árvores. Diziam que era a rua das Ciganas. Há muito tempo, talvez um século atrás, elas foram tiradas das ruas residenciais e comerciais, foram obrigadas a migrar para esta rua inabitada, que mais parecia um corredor de cabanas iluminadas por candelabros. Muito tempo depois, uma menina de rua, ou melhor, moradora de rua, mais precisamente do centro desta cidade batizada de Aurora, foi vista no minimercado do Xixo. Ela pagara uma maçã verde sem pagar. Este senhor, certo de que ela pegara também dinheiro do caixa, que ficava na entrada do mercadinho, saiu a correr atrás dela. Xixo correu até a cerca anterior à rua do Bosque. Então ele parou. Não acreditava no que via. Provavelmente a menina não conhecia a história do local para entrar sem medo nesta rua. Ninguém soube responder a esta questão e ninguém se lembraria de seu pequeno rosto assustado se não fosse um fotógrafo curioso que passava enquanto a menina e Xixo corriam. Ela hesitou por um momento, olhando para trás, neste instante foi retratada com seus olhos da cor da grama, os cabelos escuros despenteados pela corrida ao vento, os lábios ressecados e o manto vermelho que a cobria em parte da cabeça. Os olhos arregalaram-se com a luz do flash e sem saber o que fazer ela continuou a correr já descalça, por entre a rua maldita.
Ela via cabanas, via muitas mulheres cheias de jóias, longas saias e olhos grandes. Pareciam-se todas umas com as outras. Não via homens, crianças ou idosos. Caminhava lentamente, sem fôlego e cambaleando. Escurecia rapidamente. Parou e olhou para a maçã já machucada. Sem hesitar, mordeu-a com força e mastigou ferozmente. A fome era avassaladora. Não percebeu, portanto, os olhares maliciosos em volta dela. O gosto passou a ficar diferente, certamente alguma parte apodrecida. Levantou a cabeça e surpreendeu-se com a rapidez da aproximação de tantas mulheres. A jovem esbelta que estava à sua frente pegou de sua mão o caroço e fitou a mão pequenina abrindo-a totalmente. Decretou o destino daquela alma em algumas frases e pouco a pouco a menina ouvia-as dentro da mente. Fora hipnotizada, não tinha mais o controle de seu corpo e mente.
Como a maçã ela se tornava eternamente verde e estragada. A única pessoa que a viu todas as noites, até ser enterrado, foi o velho Xixo.

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