domingo, 29 de dezembro de 2013

A fratura de Anderson Silva

Sempre assisto às lutas do UFC, imaginava que o Anderson ganharia do Chris Weidman, mas aconteceu uma fatalidade que nunca havia visto. Imaginei-me no seu lugar; quantas vezes eu fui dar um chute nos treinos de Muay Thai e o oponente defendeu com o joelho? Nossa, que dor! Eu sei o que é se lesionar gravemente lutando, pois já rompi o ligamento cruzado anterior no ano de 2006... Foi uma dor imensa. Fui me recuperando aos poucos, competi, ganhei e, depois, trabalhando em uma loja de materiais de construção, comecei a sentir dores diárias, pois caminhava o dia todo, subia e descia escadas o tempo todo. nos treinos nunca sentia dor. Acabei operando o joelho.Parei definitivamente de treinar. Só que o trabalho continuou me torturando e acabei ficando lá porque os donos eram gente boa de vez em quando (exceto o fato de explorarem todo mundo) e porque tinha medo de ficar desempregada. Depois de mais dois anos, as dores começaram a piorar no quadril. Continuava na mesma empresa, então, acabei operando os dois lados do quadril. Há exatamente dois anos atrás, meu médico disse que eu poderia fazer uma infiltração para melhorar a cicatrização da cartilagem, pois já se passara quatro meses da última operação. Foi a pior coisa que já me aconteceu. Passei todo o período de férias da faculdade e, lua de mel, (Julho/2012) no hospital, a dor era tão forte, nos dois lados, que meu marido não podia mexer no colchão da cama que eu gritava de dor. Quando voltei ao trabalho, meu chefe disse que eu não poderia ficar vendendo por telefone, então não teve jeito. Não tinha condições de continuar trabalhando lá sem apoio de ninguém.
Por isso, sei o que é uma dor no osso. É a pior do mundo. Sinto muito pelo Anderson, na verdade sinto por todos os atletas que têm uma vida saudável durante a carreira e que, perto de se aposentar, ficam quebrados: Pelé, Gustavo Kuerten, Randy Couture, Minotauro... Bem, pensando nas ressalvas, este último, já é quebrado há muito tempo! Já Randy Coulture deve ter ficado com o dente mais bonito do que era, afinal tem grana! Gustavo e Pelé, meus companheiros de dor no quadril, também têm médicos ótimos.

De qualquer maneira, é muito broxante saber que somos de vidro. Eu sempre quis tanto ser ninja, mas percebi que só existem nos filmes. E, mulheres, parabéns! Estamos sendo muito bem representadas pelas lutadoras de hoje em dia! As lutas femininas estão quase melhores que as masculinas! Ótima luta entre Ronda Rousey e Miesha Tate. Só acho muito idiota essa Ronda entrar no ringue fazendo aquela cara forçada de mau. It’s not necessary, baby. Porém, nunca quero me encontrar com “nenhuma” delas pessoalmente! O que são aqueles músculos?? E aquelas quedas da Ronda? Nossa, isso assusta! Prefiro lutar com meu marido um boxe caseiro, mesmo apanhando pra valer! 

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Fim de um ciclo, começo de outro

No peito há um relógio; na fonte, outro. O ponteiro gira e retoma o movimento, amplia o ritmo e reduz o tempo, todo o tempo, infinitamente. Eu, uróboro, cresço e devoro-me, agarro meu rabo e atinjo o equilíbrio e a temperança feminina. Estou pronta. Contorço-me e me transformo em duas hélices conjugadas. Vou e volto através de meus polos. E agora, o que me resta? Tudo, ainda não estou pronta. 
No jogo da vida passamos a bola, ao passar a bola não vemos mais nada, só a bola. Não vemos o fundo, não vemos as pistas, não vemos oportunidades. É preciso experiência para passar a ver outras bolas de outras cores, outros participantes do jogo, outros elementos. Planejar é bom, mas não demais. Fazer é que torna-se importante. Se colocar no lugar do outro, ver os lados opostos, ser homem e mulher, ser água quente e fria, contornar os obstáculos. Em 2014, integre-se com o mundo, com o planeta e os seres vivos. Busque sabedoria e equilíbrio. O relógio cósmico não para, mas algumas coisas podem ser retomadas e consertadas. 

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

A REALIDADE DAS LIDERANÇAS NO MEIO NATURAL


Não se iluda com o número de páginas de um livro, isso não influencia na sua qualidade. De fato, descobri esse importante detalhe ao ler “O Velho e o Mar”, de Ernest Hemingway (originalmente publicado com o nome The man and the sea). Este pequeno livro tem aproximadamente 100 páginas, foi publicado em 1952 e, dois anos depois, recebeu o prêmio Nobel de literatura. Há uma grande integração com a natureza. Riquezas e vivências, conhecimento que o personagem Santiago nos passa a respeito da vida, pescaria, conhecimento de mundo e da natureza. Realmente digno de premiações e com uma linguagem simples e atraente.
Já havia percebido a grandeza de outros pequenos livros, como “A revolução dos bichos”, de George Orwell (originalmente publicado com o nome Animal farm). Trata-se de uma história envolvente onde os animais lutavam por mais cuidados, por sua liberdade e para construir um espaço em harmonia com os bichos; trabalhando e cuidando de seu próprio sustento sem precisar sustentar os humanos, nem tampouco dar-lhes dinheiro sem receber nada em troca. Pouco a pouco, com a liderança dos porcos, que dentre os animais eram os mais inteligentes, as coisas vão se dirigindo para uma política capitalista e autoritária, muito próxima das práticas humanas. Os porcos passam a se comportar como se fossem melhores que os outros, pois tinham as melhores ideias e maiores responsabilidades. Fica evidente que em todo o lugar onde for necessária uma liderança haverá disputa por poder e corrupção. Assim como em “O Senhor das Moscas”, de Willian Golding (originalmente publicado com o nome de Lord of the Flies), o contrário acontece: os pais de um grupo de crianças inglesas providenciaram um avião, em uma tentativa de tirá-los dos bombardeios da Inglaterra, que durante a viagem caiu em uma ilha deserta.  O piloto morre, as crianças ficam sozinhas, sem adultos ou qualquer instituição, forçados a viver juntos em um estado natural. Da civilização, passam aos poucos a esquecer; precisam de alimentos e manter a fogueira acessa para o caso de aparecer regate. Porém, nem todos estão de acordo. O instinto da caça fala mais alto no grupo do Coro, liderado por Jack e, do outro lado o grupo de escolares, liderados por Ralph, que tenta manter a ordem, respeito e dignidade. Este, de fato, é um livro mais grosso e com mais detalhes e simbolismos, percebe-se que inserido em estado natural, nosso lado selvagem fala mais alto.

A necessidade de sobrevivência nos faz selvagens? Ou sempre fomos? Somos todos irmãos: humanos e não-humanos. Precisamos dos animais para nos acompanhar, para manter o equilíbrio, para mantermos nosso sustento. Eles nos ensinam a ter persistência, ter força, ter coragem e, ainda, são incrivelmente belos. Nós existimos para proporcionar que eles se reproduzam, para manter a ordem e para garantir que nossos irmãos, os animais, tenham sua serventia, pois cada espécie tem seu valor e suas características específicas, dependendo do meio em que vivem. Nós não somos nada mais do que animais habitando cidades; já os animais são humanos que habitam a floresta. Nenhum é melhor do que o outro; nós não somos melhores que ninguém. Essa é a realidade. A realidade também é subjetiva e espacial, isto é, depende do ponto de vista dizer o que é real. Esse é o meu ponto de vista que pertence ao meu conhecimento de mundo e à minha imaginação.

domingo, 22 de setembro de 2013

Indicação de leitura

Tenho pensado muito na forma como viviam e vivem os Ìndios, a pureza, a sabedoria, alimentação, costumes. Além de eu ser descendente de Índios, minha pesquisa sobre a Ecocrítica, em especial na obra Avalovara, de Osman Lins, tem caminhado para este lado. Ou sou eu que tenho me inclinado à isso? O fato é que pela perspectiva da Ecocrítica não existe uma linha divisória entre humanos e não humanos, a natureza e seus elementos estão integrados e mediam as relações entre os seres. Por tudo isso, ninguém melhor que os primeiros donos da nossa natureza para que percebamos a importância do meio ambiente e do amor que deveríamos ter com ele.
Este livro retrata todo esse amor
e respeito.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Contos de Som e Silêncio

Para quem gosta de literatura, arte, música, inovação, etc., ofereço meu livro e de meus colegas de contos! São contos inspirados em letras de músicas, a minha é Medo da Chuva, de Raul Seixas e Paulo Coelho. Há outros 12 contos com autores de diversas partes do Brasil, diversas músicas para sonhar, viajar. Seguem os nomes dos autores: 


Livro coletivo - Organizado por Marcelo Spalding

Alexandre Braoios,
Bertolina Maffei, 
Carolina Utinguassu Flores (eu),
Clara Oliveira, 
Érika Gentile, 
Evelena Boening, 
Fatima de Barros Plein,
Fernanda Carvalho,
Isi Caruso,
Jussara Maria Nodari Lucena,
Marcelo Spalding,
Marcio Tadeu Furrier e
Valesca dos Santos Pederiva.


LER É MANTER-SE VIVO, CRIAR É 
PARTICIPAR DO MUNDO, PESQUISAR É
EXPANDIR HORIZONTES, COMPARTILHAR É
ESTAR NO CENTRO DA TERRA, REGAR A ÁRVORE É ADQUIRIR GALHOS, GALHOS SÃO CONHECIMENTO, CONHECIMENTO É MANTER-
-SE VIVO PARA REPETIR A LEITURA. 
Tudo é repetição em ritmo, a cada repetição
eu cresço. A espiral nunca acaba.

Por Carolina Utinguassu Flores

Interessados em comprar esta bela coletânea (R$ 15,00) entrar em contato pelo e-mail: carolflores02@hotmail.com

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

A ESPAÇOSA


Quero escrever, escrevo agora como nunca escrevi antes. Todos os nomes me vêm à mente, expressões e vontades irrequietas para serem projetadas, produzidas e empurradas para o grande mundo que existe fora da barriga.
Achava que não gostava de poesia, achava que não conhecia a métrica, o ritmo e a profundidade de poetizar. Achava que não iria querer coisas que, agora, se encaminham para um “sim, eu aceito”. Parecia que nunca casaria e então, como um presente de Deus espontâneo eu tenho agora o maior de todos os casamentos do cosmos  e suas raízes, de outros pequenos casamentos, outros radianos  com diferentes ângulos que se desprendem do núcleo que gira em torno de uma grande luz. Vejo a luz contornando os caminhos, vejo a luz mesmo quando ela dá lugar à escuridão que também é bela.
Obrigada Renato Russo por cantar para mim sem eu pedir e me mostrar o que nunca enxerguei nas palavras soltas que simbolizam o que pensava minutos antes, se disciplina é liberdade, já estou livre. Hoje eu sofro para rir, e muito, amanhã.
Estou quietinha, mas trabalhando a mente. Meu descanso é quando exercito o corpo. Estou no caminho certo, ninguém precisa afirmar, sei quando estou errada e quando não estou. Crio, copio, modifico, parafraseio, conto. Tudo começa em um conto, por isso comecei, fiz, faço e farei. Não farei para ganhar dinheiro, farei para que um dia eu não esteja mais aqui e escute de cima muitas vozes falando de minhas obras e pontos de vista. Então não morrerei. Será, então, que reencarnarei? Se reencarnar, ouvirei as vozes chamando meu antigo nome? As engrenagens  lunares e solares estão engrenadas entre o movimento planetário mágico e cíclico, infinitamente gerando o caos, pois nada é totalmente linear. Assim não é o ciclo masculino, muito menos será o feminino.

O que seria dos inteligentes se não existissem os burros? O que seria dos espaços vazios se não existissem os espaços preenchidos? Nada existiria, nada se sobressairia ou se confundiria. Se meus quadris não doessem mais eu poderia ser mais feliz, mas quem não tem limitações? Quem não tem seu lado ímpar? Não sou retilínea, não sou curvilínea, tenho minha própria forma, ordem e espaço. Sou “uma” coisa única, mas não sou redonda. Sou limitada, mas não quadrada. Achava que não queria. Achava que não chegaria a ser geométrica

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Orgulho de ser pensante


 As pessoas felizes não agridem. A crueldade é característica dos cultos. Quem é inteligente, não precisa xingar, ser grosso ou gritar, apenas dizer o necessário para tocar fundo o receptor. A violência é fruto da nossa falta de comunicação ou estudo. As mágoas não levam a nada, são prisões com fortes grades que ofuscam o brilho dos olhos, mas existem.  Só sei que, por mais que elas queiram fazer parte de mim, eu não vou deixar. Mesmo que esteja sozinha. Aproveito a falta de convite, aproveito meu momento. Então, por que não perdoar? Relevar? Perdoar é sabedoria, não é fraqueza, é ser nobre, é saudável. Só assim é que chegamos a um progresso interior que permite à felicidade se instalar. Antes dela, temos que chorar muito mais do que sorrir para dar valor ao que já adquirimos. Devemos ter um projeto que envolve educação da mente, reforma espiritual e mentalização. O ciúme também consome muita energia... deixe de lado, se não for algo realmente sério. 
Quando nos achamos azarados, pé-frio ou dedo podre, de algum desses acontecimentos, que às vezes parece ser ruim, surge o lado bom. O projeto é ser feliz. Se eu tivesse que anotar algo para colocar na minha lápide do cemitério, colocaria meu tempo de felicidade subtraídas as tristezas, pois meus dias felizes são incontáveis.
Lembre-se: 
Quem lê enxerga melhor nas entrelinhas e nos simbolismos da Palavra.
Crie, invente, brinque!
Use de acurácia ao escrever, lapide, transforme seu texto!
Organizar o pensamento inaugura mundos novos, escolhas e ações.
Concilie vida e palavra
Invente um D. Pedro III



domingo, 14 de abril de 2013

OURO DE TOLO


Eu tinha apenas cinco anos. Morávamos em uma casa na Lapa. Meu pai era alcoólatra. Certa vez, chegou em casa “naquele estado”, bateu em minha mãe, em mim e quebrou tudo dentro de casa. Ela também batia nele. Esta cena se tornou comum. Eu não entendia muita coisa, só sentia medo. Era estranho ver minha mãe sempre triste, os vizinhos sempre preocupados e oferecendo ajuda. Era um clima de incertezas e pânico. Cada vez que ele chegava bêbado, meu peito doía, mesmo com toda a vontade de brincar que existe dentro de uma criança desta idade, vinha uma imensa sensação de paralisia. Minha mãe não aguentou mais aquela situação, mandou-o embora e pediu ajuda aos vizinhos. Ele foi, levando todos os nossos móveis, com exceção da geladeira, fogão, um colchão, televisão, umas almofadas e o rádio. Na outra semana, porém, estava eu sentado nas almofadas vendo televisão e ele chegou. “Oi filho”, disse ele entrando. Assustado e acompanhando seus passos eu respondi apenas “Oi”. Ele pegou o rádio, explicando que era dele e precisava levá-lo. Quando minha mãe chegou do trabalho contei a ela. Sentou-se no chão e chorou calada. Perguntei por que ela estava chorando. Ela me disse que estava apenas lavando os olhos por dentro. Tivemos muitas dificuldades financeiras e passamos fome por dois anos. Para ela sair para trabalhar era necessário que eu esquentasse minha comida para almoçar, sozinho, assim como ir para o colégio, sozinho, pegando dois ônibus. Eu tinha seis anos.
 Minha adolescência foi conturbada, não queria estudar nem pensar em trabalho. Só queria namorar, andar de skate, desenhar, jogar bola e vídeo game. Quando fiz dezenove anos, percebi que era hora de mudar, via minha mãe desesperada para nos sustentar, “ainda”, fazendo tudo para que eu tivesse mais responsabilidade. Mas eu não sabia o que fazer e ficava nervoso. Quando sentia aquele aperto no peito, pensava na única coisa que meu pai me ensinou, num dia que estava sóbrio. Ele me disse: “Quando você ficar nervoso ou com medo, respire fundo até acabar o ar do pulmão e solte lentamente, que então passará”. Via as outras pessoas trabalhando normalmente, e eu, naquele dilema. Se gostava de algo, ou não, nem sabia. Quando me olhava no espelho sentia nojo daquela imagem: magricelo, barbudo, alto demais. Minhas roupas eram todas velhas, de pessoas que não as queriam mais. Precisava de um emprego pelo menos para comprar coisas que ela não podia me dar. Elaborei uma lista de coisas que gostava. Eu gostava de desenho, música e de ler. Precisava de um norte. Uma tia minha me disse que isso tudo era um hobby. Continuei desenhando e ouvindo minhas músicas. Meus desenhos eram macabros, demoníacos e monstruosos. Como alguém, além de mim, poderia gostar deles? Acho que a música sempre me inspirou. Sem ela, eu não fazia nada, nem comia. Senti muita vontade de comprar um violão e aprender a tocar. Minha família toda estava preocupada comigo, minhas primas, tios e tias, avó e... arrumei um amigo, que também se mostrava confuso com minhas escolhas, ou a falta delas. O cara se chamava Érico, e eu, desculpe não ter me apresentado antes, me chamo Léo. Leonardo Martins. Ficamos amigos um dia que ele se interessou por um papel amassado que joguei no pátio dele. Era para ter ficado furioso, se fosse eu, ficaria.
De vez em quando ele me pedia para fazer certos tipos de desenhos com foco em quadrinhos, charge, etc. Tinha o apoio dele, então, finalmente estava decidido a buscar trabalho como Desenhista. Eu não queria mais aceitar a ideia de que era apenas um hobby. Eu sabia que tinha algum talento. Através do Érico conheci outras pessoas da Lapa que quase toda a semana se encontrava nos ensaios da Banda. Convidaram-me para tocar com eles diversas vezes, mas eu não estava preparado. Eu aproveitava para comer bastante das pidzzas da mãe do Érico nestes ensaios.
Depois que fui descobrir que ele não trabalhava apenas na recepção de uma Editora, e sim, na produção editorial como Coordenador Ilustrativo. Fui chamado pelo supervisor dele e consegui um emprego de Desenhista Ilustrador. Até fui à Igreja depois disso! Depois de muito tempo buscando, lutando, procurando dar uma guinada na minha vida, Deus me enviou a pessoa certa.
Fiz uma rotina de estudos, trabalho e lazer. Queria passar no vestibular, botei isso na cabeça e não comentei com ninguém. Meus amigos me chamavam para as festas, ensaios, e fatalmente, eu acabava negando algumas vezes. Só não negava todos os convites para não perder as amizades. Eles bem que achavam estranho meu isolamento. Só contei a todos que passei no vestibular quando já estava feita a minha matrícula. Graças ao meu salário, ajudava a pagar as contas em nosso novo endereço, em Ipanema, pagava a faculdade de Artes Plásticas e ainda comprei uma moto.
A parte esquisita, é que passei a ser, de certo modo, recluso. Isto porque me acostumei a estudar, ler, desenhar e quando não fazia isto, me sentia culpado. Além de sentir culpa, gostava, é claro. E foi assim, durante os quatro anos do curso. Os meus amigos da Lapa me consideravam, talvez, velho e sem graça. Eu tentava ser diferente, eu tento. Diversas vezes, no meio de minha euforia por estar estudando e alavancando minha profissão, vinha aquele antigo desânimo. Uma sensação de que esse stress de dormir pouco, desenhar, ter ideias sem parar, reservar todo o tempo do mundo para estudar... Tudo isso, nunca iria acabar.
O que existe de mais certo no mundo é que tudo um dia tem fim. Minha faculdade chegou ao fim. Sentia um misto de felicidade, alívio e nostalgia. Eu, que nunca me deixava derrubar lágrimas, desta vez não consegui segurá-las. Eu estava pegando o canudo, havia muitos flashes, meus amigos e minha mãe, que me olhava emocionada e orgulhosa. Estavam todos lá por mim e eu estava graduado e inseguro. Pensei: “e agora? O que eu faço? Parecia tão distante e difícil de alcançar este universo”. Olhei para o canudo novamente, me dirigi para a banca. “Pensando bem foi tão fácil conseguir e agora eu me pergunto: E daí? Eu tenho uma porção de coisas grandes pra conquistar, e eu não posso ficar aí parado”.




Inspirado na música:


OURO DE TOLO
Raul Seixas

Eu devia estar contente
Porque eu tenho um emprego
Sou um dito cidadão respeitável
E ganho quatro mil cruzeiros por mês

Eu devia agradecer ao Senhor
Por ter tido sucesso na vida como artista
Eu devia estar feliz
Porque consegui comprar um Corcel 73

Eu devia estar alegre e satisfeito
Por morar em Ipanema
Depois de ter passado fome por dois anos
Aqui na Cidade Maravilhosa

Ah! Eu devia estar sorrindo e orgulhoso
Por ter finalmente vencido na vida
Mas eu acho isso uma grande piada
E um tanto quanto perigosa

Eu devia estar contente
Por ter conseguido tudo o que eu quis
Mas confesso abestalhado
Que eu estou decepcionado

Porque foi tão fácil conseguir
E agora eu me pergunto: E daí?
Eu tenho uma porção de coisas grandes
Pra conquistar, e eu não posso ficar aí parado

Eu devia estar feliz pelo Senhor
Ter me concedido o domingo
Pra ir com a família ao Jardim Zoológico
Dar pipoca aos macacos

Ah! Mas que sujeito chato sou eu
Que não acha nada engraçado
Macaco praia, carro, jornal, tobogã
Eu acho tudo isso um saco

É você olhar no espelho
Se sentir um grandessíssimo idiota
Saber que é humano, ridículo, limitado
Que só usa dez por cento de sua
Cabeça animal
E você ainda acredita que é um doutor, padre ou policial
Que está contribuindo com sua parte
Para nosso belo quadro social

Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada cheia de dentes
Esperando a morte chegar

Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco voador

Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada cheia de dentes
Esperando a morte chegar

Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco voador

domingo, 17 de março de 2013

COMPREENSÃO


Nas ocasiões em que morria alguém especial um sentimento de aperto a fazia chorar e pensar: “Que pena, era tão jovem, coitado. Que tristeza que é a morte, como a vida é frágil”.  No final do dia, com tantas lágrimas derramadas, tentava afastar o medo de sua própria morte e a morte de outros familiares ou amigos, então chegava uma hora em que só queria descansar deste pesadelo e esperar um novo dia. Considerando uma vida inteira, o sentimento que mais fazia Rebeca chorar era a raiva e mágoas, causadas por brigas. Nunca, porém, imaginou que um sentimento de incompetência e inutilidade a abalasse tão facilmente, cujo suspiro e respiração profunda, ao invés de acalmá-la, trouxessem uma cachoeira de lágrimas velozes aos olhos. Uma impressão de que nunca progrediria e que todos viam seu fracasso. Medo de errar novamente. Percebia, enfim, que não só o corpo era frágil, mas o psicológico também caminha na corda bamba. Sentada numa mureta, as lágrimas quentes escorriam pelas bochechas. Precisava ficar sozinha. Estava indignada com sua incapacidade. Ao seu lado havia um mendigo agachado num bueiro. Sentiu-se uma estúpida dramática reclamando de bobagens. Agora chorava por ele.



domingo, 24 de fevereiro de 2013

SIMPLES ASSIM


Fiquei bem à sua frente. Ela gesticulava muito, mas eu mantive-a sob meus olhos. Eu tentava falar e ela não me escutava, falava sem parar. Ao mesmo tempo em que gesticulava, chorava, e isto me deixou desconfortável. Fiquei a pensar em meu projeto, enquanto ela tagarelava eu fazia de conta que concordava com tudo. Melhor não falar nessas horas. Uma pessoa passou por nós, difícil de identificar rostos da silenciosa noite. Uma aliada. O homem foi-se andando sem olhar para trás desapareceu. Enfim ela se cala balançando a cabeça inconformada, talvez, por não obter respostas. Chegou a hora de gozar deste momento. Acabou o tempo. Após cair duas lágrimas de seu rosto pálido e gelado, atirei duas vezes à queima roupa. Abaixei-me e saí a rastejar.


A noite estava gelada como sempre. Eu costumava passar sempre por uma rua de casas bonitas antes de chegar à minha parada para pegar o ônibus. Sempre atento, avistei um casal que discutia, era véspera do dia dos namorados. Procurei não olhar muito, mas tenho boa audição e, infelizmente, sou fofoqueiro! Ouvido de fofoqueiro não precisa se esforçar tanto. Antes de chegar até eles percebi que a garota chorava, balançava as mãos como se estivesse se explicando de algo, fazia movimentos de negação com a cabeça, pegava no celular e mostrava a ele. O homem com ela era bem mais velho, nitidamente grisalho, alto e magro. Ela, uma jovem morena que vestia jeans e blusa laranja. Foi o que pude ver. O homem não dizia nada, não se mexia e não me olhou. Quando passei ouvi então ela dizer “você não tem respeito por ninguém e mesmo assim estou tentando te fazer entender, já disse tudo...” mais uns segundos passaram e ela completou com algo como “vou à polícia”.  Mas não sei, não tenho certeza desta última frase. Em seguida antes de chegar ao meu destino, dei uma olhadinha curiosa por entre um poste onde clareava parcialmente o rosto do homem. Era parecido com um tio meu, os olhos pequenos e rasgados, o nariz batatudo, barba por fazer. Eles estavam atrás de um carro. Ouvi dois tiros. Abaixei-me, perplexo. No instante seguinte olhei novamente e como o homem sumira, corri até ela. Estava perto ainda, mas nada do homem que a feriu. Não soube identificar onde se originava os ferimentos. Chamei a polícia e ambulância. Quando a polícia chegou, ela não respirava mais. A ambulância a levou direto ao IML. Não sei de mais nada. Eu tenho boa memória, posso fazer Retrato Falado.

Por volta de duas horas da manhã ele recebeu a convocação para receber a testemunha de um crime. A moça se chamava Isabela, conforme seus documentos encontrados na bolsa. As últimas ligações eram para a mãe, que também já estava lhe aguardando na sala de interrogatório. Primeiro, falou com a testemunha, o rosto do assassino já estava confeccionado e foi, posteriormente, mostrado à mãe. Ela imediatamente reconheceu o homem. Seus olhos vidrados na imagem confessaram, mas a boca negou. Suas suspeitas agora caíam sobre a mãe da garota. Na manhã seguinte, procurou evidências no celular da moça. Entrou em e-mail, Skydrive, redes sociais, imagens, vídeos e nada. Ao reler o depoimento do jovem que testemunhou o detetive percebeu que poderia ter alguma palavra fora de lugar ou alterada. As investigações seguiram. Ele foi à casa da falecida, em seu computador parecia tudo normal, até entrar na lixeira. Havia um vídeo datado da semana anterior ao assassinato. A gravação mostrava o próprio detetive fazendo uso de cocaína juntamente com a irmã de Isabela e o padrasto, que faziam sexo no chão do quarto da mãe. O caso estava encerrado para ele. Bastava achar o assassino e apagar as provas.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Aventura

    Ao passar pelas areias de Copacabana avistamos um imenso balão, estava anoitecendo, veríamos o pôr do sol de pertinho. O vento parecia estar a favor. Onde desceríamos não era importante, seria a maior aventura de nossas vidas: voar junto dos pássaros, passar dos telhados dos grandes prédios e ir além dos morros. Quando meus pensamentos estavam querendo chegar no quesito “segurança”, ele me trouxe minha bebida, que não era a água de coco, a qual eu havia pedido. Durante a longa fila de espera bebemos muitas latinhas de cerveja, rimos, fizemos alongamentos e o tempo passou. Quando eu queria ir ao banheiro ele ficava na fila e vice-versa. Uma hora, duas, três. Não desistíamos, estava chegando perto e parecia que quanto mais perto, mais demorava o andamento. Já fazíamos planos de voar também de asa-delta. Se eu vomitasse não pegaria na cabeça de ninguém mesmo! Um bêbado, mais bêbado que agente, arrumou briga na fila porque achava que deveriam distribuir água para as pessoas enquanto esperavam. Mais adiante um pastor gritava num palco improvisado, sem perceber que Deus escutaria do mesmo jeito se ele falasse normalmente. Tudo estava ótimo, mesmo quando eu perguntava a ele se aquela casinha não balançaria demais e derrubaria agente ou se o fogo não incendiaria nossa cabeça. Ele pegou minha caixinha milagrosa em seu bolso, tomei meu remédio do pânico, sem perceber que o álcool tiraria seu efeito. Uma moça pisou no meu pé e eu já não sentia meus dedos, não sentia minhas bochechas nem medo.  A expectativa aumentava a sensação de liberdade dele e minha loucura. Enfim, restavam somente cinco pessoas. Ou eram mais de cinco? Bebemos tanto que acordamos de manhã com o rosto duro de queimaduras de sol. Pois é, a bebedeira ajudou a passar o tempo. Mas não vimos o balão voar.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

PRONTO PARA MATAR


     Ele recebeu o telefonema tarde, alguém pedindo sua ajuda para um trabalho árduo. Se não fosse um negócio consideravelmente bom, certo que não iria, mas há muito tempo queria fazê-lo pessoalmente. O momento era esse. A recompensa seria compensatória. Dirige-se a uma estante e pega abaixo dela uma caixa grande. Sim, tinha que sair logo, mas seria breve. Acha finalmente seu machado. Seria suficiente. De estômago vazio, pega as chaves e sai, está com suas botas pretas, colocadas propositadamente para não manchar de sangue, uma camisa marrom e na calça Jeans velha, seu facão. Ninguém no trânsito, ausência de buzinas. Seu olhar analítico já sabia de cor onde seria a execução, uma pupila vidrada e impaciente. Luzes ofuscavam nos luminosos por onde passava, mas não havia mais nada nem ninguém. Logo que avistou uma delegacia virou na esquina anterior rapidamente. O seu sangue frio o fazia acelerar, só de pensar que ela fugisse. Chegou a uma casa verde e branca, como eram muitas outras casas deste mesmo bairro, desta cidade vazia. A casa, porém, parecia ser o único lugar com gente acordada, tudo estava calmo. Teria que ser rápido para não ouvirem os gritos. Ele tinha a manha. Estacionou com perfeição fazendo apenas duas manobras. Abriu a porta, após alguns passos pela grama molhada e quando ouviu vozes parou. Olhou em volta, pegou o facão por precaução. Percebeu que havia alguns desconhecidos, o que talvez não fosse uma boa ideia. Entrou pela porta sem olhar para trás, no fundo do corredor passou por uma mesa com bebidas e não fez cerimônia, tomou um copo de cerveja, entrou no pátio e lá estava ela, atrás da cerca correndo, cambaleando e com seus olhos arregalados. Estava machucada em uma das pernas. Quem o solicitou o esperava em frente, um ar sério e cansado, cabelos brancos, vestindo um pijama amassado e usando pantufas:
- Meu filho, sei que não é uma boa hora, mas estou velho para essas coisas, pelo o que sei, tu ainda não jantou, então se tu quer comer, vai ter que dar um jeito nessa galinha. Ela só grita e corre o tempo todo! – e então obedecendo ao velho pai, o gaúcho olhou para a galinha, entrou na cerca e a golpeou de uma vez só. Missão cumprida.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

UMA PRESSA INCONTROLÁVEL



    Fui apresentado ao eletricista e fiquei aliviado, pois não precisaria fazer eu mesmo o trabalho. Momentos antes eu estava quase cometendo a burrice de mexer na rede, já que não aguentava mais a pressa em inaugurar meu novo atelier, com belos retratos de molduras douradas, feitos por mim. Quem me impediu de fazê-lo foi minha eficiente secretária, pois com eletricidade não se brinca, então acatei. Às vezes penso se meu lado homossexual é a causa dessa frescura, desse medo de eletricidade, do receio de arriscar, resolver os problemas dos imprevistos que se atravessam nos meus preciosos minutos. Bem, nada contra eletricistas, então me dirigi à sala principal, onde seriam feitos reparos simples de troca de duas tomadas. Com isto, cessaria o inconveniente das faíscas e aquele barulhinho chato indicando curto circuito. Entrei calmamente e bem quieto, sem que ele pudesse perceber fiquei a admirá-lo. Eu, magro e baixo, ele... Alto e forte. Fiquei a imaginar como seria aquele homem, gosto de morenos. Certamente ele também era gay. Mas pensando e imaginando, não pude controlar minha ereção. Poderia ter saído do mesmo jeito que entrei, esquecendo totalmente dos fios que aquelas mãos pesadas tocavam. “Só que não.” Por ali continuei e, ao virar para trás, o eletricista deparou-se comigo a analisá-lo. Ficamos a nos olhar. Ficamos a nos olhar por alguns ansiosos instantes, ele sem entender, desceu os olhos para minha bermuda. Ele percebeu. Espantado, voltou sua cabeça para o que fazia anteriormente, pegou em um fio e sem prestar a devida atenção cortou-o junto com outro, deixando uma falha na fita isolante. Levantou-se com o olhar baixo, dizendo:
– Está feito, vou ligar a luz e depois acertar com a secretária. – disse o eletricista, bufando e secando o suor, quase correndo até o quadro de luz.
     Após isto, nada mais. Apenas o cheiro de queimado misturado com álcool. Acordei no hospital certo de que precisava mudar. Não era a primeira vez que errava o alvo.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

A RUA DO BOSQUE



Havia muita história a respeito da rua proibida. A tal rua do Bosque. Aliás, de bosque não havia nada, era escura, sem flores, canteiros e árvores. Diziam que era a rua das Ciganas. Há muito tempo, talvez um século atrás, elas foram tiradas das ruas residenciais e comerciais, foram obrigadas a migrar para esta rua inabitada, que mais parecia um corredor de cabanas iluminadas por candelabros. Muito tempo depois, uma menina de rua, ou melhor, moradora de rua, mais precisamente do centro desta cidade batizada de Aurora, foi vista no minimercado do Xixo. Ela pagara uma maçã verde sem pagar. Este senhor, certo de que ela pegara também dinheiro do caixa, que ficava na entrada do mercadinho, saiu a correr atrás dela. Xixo correu até a cerca anterior à rua do Bosque. Então ele parou. Não acreditava no que via. Provavelmente a menina não conhecia a história do local para entrar sem medo nesta rua. Ninguém soube responder a esta questão e ninguém se lembraria de seu pequeno rosto assustado se não fosse um fotógrafo curioso que passava enquanto a menina e Xixo corriam. Ela hesitou por um momento, olhando para trás, neste instante foi retratada com seus olhos da cor da grama, os cabelos escuros despenteados pela corrida ao vento, os lábios ressecados e o manto vermelho que a cobria em parte da cabeça. Os olhos arregalaram-se com a luz do flash e sem saber o que fazer ela continuou a correr já descalça, por entre a rua maldita.
Ela via cabanas, via muitas mulheres cheias de jóias, longas saias e olhos grandes. Pareciam-se todas umas com as outras. Não via homens, crianças ou idosos. Caminhava lentamente, sem fôlego e cambaleando. Escurecia rapidamente. Parou e olhou para a maçã já machucada. Sem hesitar, mordeu-a com força e mastigou ferozmente. A fome era avassaladora. Não percebeu, portanto, os olhares maliciosos em volta dela. O gosto passou a ficar diferente, certamente alguma parte apodrecida. Levantou a cabeça e surpreendeu-se com a rapidez da aproximação de tantas mulheres. A jovem esbelta que estava à sua frente pegou de sua mão o caroço e fitou a mão pequenina abrindo-a totalmente. Decretou o destino daquela alma em algumas frases e pouco a pouco a menina ouvia-as dentro da mente. Fora hipnotizada, não tinha mais o controle de seu corpo e mente.
Como a maçã ela se tornava eternamente verde e estragada. A única pessoa que a viu todas as noites, até ser enterrado, foi o velho Xixo.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

O QUE OS OLHOS NÃO VÊEM, A BARRIGA NÃO SENTE


Ronaldo era um menino alegre e arteiro, estava sempre correndo aqui e ali, sem camisa, com suas bermudas quase sempre rasgadas e chinelos amarelos. Morava em uma chácara com os pais, num bom terreno em Santo Antônio da Patrulha. Era uma casa simples, toda branca, janelas pintadas de cinza e apenas três cômodos.  Gostava muito do cheiro do campo, do carrinho que costumava passear com seu pai - onde quase não cabia mais - em dias de sol. Nos dias que cansava de andar no gramado perto das laranjeiras, gostava de correr numa trilha de pedras que havia construído com muito esforço. Talvez por isso fosse tão magro, estava sempre procurando algo para fazer e esquecia-se de voltar no horário das refeições.
Seu pai, Dionízio, tinha problema nas pernas e por isso achava ótimo que seu filho aproveitasse aquilo que ele não tinha mais condições de fazer. As pernas tortas e o problema na coluna o faziam mancar. Após alguns anos correndo atrás de mulheres comprometidas acabou levando uma surra, de um dos maridos traídos, deixando seu estado de mal a pior.  Em casa, seu filho e a mulher Flavialine conheciam outra história. Uma história triste, mas digna. Dizia o Dionízio, para aqueles que perguntavam que seu problema originou-se de uma pescaria onde foi puxado para dentro do riacho e a queda lhe causou essa maré de azar. Pobre homem! – Exclamava Flavialine todas as vezes que escutava o marido a contar a mesma história triste, sem notar que o pior cego é aquele que não quer ver. Ela, mãe de primeira viagem e super protetora, geralmente preocupava-se além da conta com as saídas de Ronaldo, afinal poderia cair, ser picado por algum animal peçonhento, perder-se... E, além disso, nunca se alimentava direito. Ela sempre dizia: Meu coração, comer é o melhor para poder crescer! Seu menino de ouro, porém, nunca dava atenção a sua boa mãe e comia apenas migalhas ao voltar para casa.
Certo dia algo terrível aconteceu. Ronaldo estava desatento, pensativo e pegou a barca para atravessar o riacho. O mesmo riacho em que supostamente seu pai havia quebrado algumas vértebras e feito a coluna cair. Pensava em como seria bom ter amigos, visitar lugares diferentes, estudar, ficar inteligente como os homens que compravam os produtos da Chácara. Foi então que, com o olhar parado e distante, não se deu conta que havia uma madeira solta na barquinha e bateu em umas pedras onde estava mais raso, resbalando e caindo com a face nesta madeira. Teve alguns machucados leves nos joelhos, mas seus olhos foram atingidos e ele não via mais nada. De longe, vinha sua mãe, voltando com uma cesta de batatas recém-colhidas. Ouviu os gritos desesperados de seu filho e pôs-se a correr desajeitada. Socorreu-o, chamou médico, limpou os ferimentos e estancou o sangue. Não podia fazer mais nada, só esperar pelo médico. Ele demorou e Ronaldo nunca mais viu o mundo, que era tão colorido.
Desde então, começou a fazer tudo o que a mãe mandava, passou a escutar muito bem, estudar Braile, dormir mais, comer mais como pedia sua mãe e escutar mais música. Sua vida era ouvir os elogios da mãe, ouvir o barulho das chinelas do pai, ouvir, ouvir e ouvir.
O que mais ouvia era que a comida é o melhor para poder crescer. Então comia. Comeu tanto que cresceu, mas como não enxergava sua forma achava que estava muito bem, sua mãe sempre o fazia pensar que era assim: lindo, forte e saudável. Agora mesmo é que não poderia ir para a escola, não tinha ideia de como seria falar com outra criança, mas já estava acostumado a escutar o rádio para se distrair. Uma vez o locutor disse que comemos com os olhos, então quem sabe comendo com as mãos ficaria saciado mais rápido? Passou a comer com as mãos, dispensando os talheres. Algo lhe dizia que não era normal comer tanto, mas sua mãe afirmava o contrário. Então continuou a comer. Nunca estava satisfeito, mas a barriga doía. Não entendia por quê. Antes, quando passava os dias correndo, a barriga também doía sem ter comida dentro. A vida foi passando e ele não via. Ele não via a comida. Não via a barriga que crescia. Sua mãe, porém via, mas preferia-o por perto, já que Dionízio sumira.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Mini conto

Estou me aventurando a escrever contos e mini contos, dois deles já estão publicados no site: http://www.minicontos.com.br/?apid=0&tipo=2

É um universo completamente diferente que abre novos caminhos. Além disso, comecei a fazer um curso muito interessante on-line no site: http://www.escritacriativa.com.br/

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

LUTA PELA VIDA




É tão comum ver-mos humanos matando humanos e animais caçando uns aos outros. Estou dizendo isso por refletir a respeito do filme “As aventuras de Pi”. É um filme muito inteligente, pois mostra os contrastes e extremos a que se pode chegar dependendo da situação em que nos encontramos.
Da infância à maturidade, das perdas aos desafios, à busca do significado do seu nome que leva ao encontro da racionalidade, da devoção a várias religiões à harmonia entre elas, do menino à fera, uma floresta devoradora e humanos fazendo papel de animais. O tigre retorna à selva e o ser humano encontra a libertação.
O interessante da história é a beleza da natureza e dos animais, mas infelizmente não há harmonia entre os seres quando eles são forçados a lutar pelas suas vidas em pleno oceano. Ao contar a história, Pi, o único sobrevivente do naufrágio, apresenta duas possibilidades que podemos escolher. Essa escolha pode ser com base nos fatos em que acreditamos ser mais reais ou mais aceitáveis. Mais real seria humanos enlouquecidos e cheios de ira se matando para conseguir entrar e ficar no bote. Mais aceitável seria pensarmos que havia no bote, junto com Pi, um Tigre, uma Hiena, uma zebra e um Chimpanzé fêmea, estes últimos machucados. A Hiena mata o Chimpanzé fêmea e a zebra. Depois o Tigre mata a Hiena. Durante o resto do percurso o homem tenta dominar a fera e eles conseguem conviver no mesmo espaço. O humano domina a fera e cuida dela. No final, a fera desaparece na floresta, seu habitat natural.
É curioso, mas apesar de termos instintos ruins, Deus não criou os seres humanos para se caçarem, os animais, porém, nasceram como presas e predadores, eles sim são selvagens. E, no entanto, nós somos capazes de cometer absurdos e nos tornarmos animais sem sentimentos.
É fácil matar e mais fácil ainda é ver bandidos se livrando de crimes hediondos. Que mundo é esse? Um mundo que, apesar de tantas injustiças, tem um criador. Mas a culpa de todos os males não é dele, é dos humanos.